quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Esperando Doutor I

por Gustavo Stevanato

“Oh! silêncio das salas de espera
Onde esse pobres guarda-chuvas lentamente escorrem...
O silêncio das salas de espera
E aquela última estrela...
Aquela última estrela
E, na parede, esses quadrados lívidos,
De onde fugiram os retratos...
De onde fugiram todos os retratos...
E esta minha ternura,
Meu Deus,
Oh! toda esta minha ternura inútil, desaproveitada!...”

Mário Quintana

Salas de espera são confortavelmente irritantes. Não me considero impaciente. Ainda espero pelos ônibus que nunca passam, as namoradas que se atrasam e pelos filmes que nunca terminaram de passar. A velocidade é um prazer de cretinos. Eu poderia esperar qualquer outono sabendo que teria a primavera. Mas o que me faz regular o assento, procurar por uma posição comôda enquanto anseio por um cigarro – um trago e já estaria longe dali – são os pensamentos que me correm à mente. Não suporto as epifanias e seus momentos embriagantes. E mais que tudo: as pessoas que pacientemente parecem gritar silenciosamente por socorro.


Poderia ter acordado um tanto totalitário. Encontrar desprazer num pé à frente do outro ou na xicara de café que insiste em esfriar. Os passarinhos que irritantemente vêm a minha cozinha anunciar o nascer de um novo dia, quando queria apenas que ele já tivesse se posto. Não ligaria se quando voltasse do consultório – a secretária esboça uma reação de um chamado, mas não, é apenas um bocejo – e encontrasse eles mortos velando-se em girassol e alpiste se nenhum pio. Mas o que incomoda não é esperar. Tenho paciência em contar o número de pacientes a minha frente – um senhora redonda de sorriso largo e varizes aos prantos com a saia que não alcança os joelhos e tipos que desconheço por opção – e ler revistas politicamente esdrúxulas ou contratos médicos indecifráveis, como se tivesse alguém neste meio de raquiticos um médico em potencial ou estudante de medicina tardio.

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